Proibir, restringir, resistir… para alargar o campo das possibilidades. Carta de Muriaé por territórios livres de mineração

Resultado dos debates no Seminário Nacional “Diferentes Formas de Dizer Não”, realizado em Muriaé/MG em agosto de 2019, a Carta denuncia o modelo minerário brasileiro, defende o direito a dizer não de comunidades afetadas e aponta para a importância da construção de lutas que enfrentem violações de direitos e transformem o padrão dos empreendimentos minerários no país. 

Nós, comunidades, organizações e movimentos de 15 estados brasileiros, reunidos na Serra do Brigadeiro (Muriaé/MG) entre 12 e 15 de agosto de 2019, no Seminário Nacional “Diferentes Formas de Dizer Não: experiências de proibição, resistência e restrição à mineração”, reafirmamos que a mineração é uma atividade destruidora dos ambientes, dos ecossistemas, da biodiversidade e de vidas humanas, prejudicando crianças, jovens, adultos, idosos, mulheres, homens, LGBTTs e povos tradicionais que habitam os territórios expropriados pelas empresas mineradoras.

Os crimes cometidos pelas mineradoras em Mariana e Brumadinho comoveram a sociedade brasileira e o mundo e demonstraram os poderes destrutivos, desumanos, cruéis e indiferentes desse setor frente às comunidades, aos trabalhadores e trabalhadoras e às necessidades reais de toda a sociedade brasileira. O desrespeito aos direitos básicos praticados por essas empresas atingem também os trabalhadores e trabalhadoras da mineração, apontando a necessidade de se construir lutas e pautas conjuntas rumo a uma transformação estrutural do modelo mineral brasileiro, em que sejam questionadas as bases de produção e consumo que sustentam essa cadeia movida à violência e violação de direitos.

A mineração está assentada em interesses de lucros acima de tudo se beneficiando e agravando as múltiplas injustiças históricas como o racismo, o etnocentrismo, o machismo e o patriarcado, impactando as comunidades negras, indígenas, pescadores e pescadoras e outros povos tradicionais, populações urbanas e camponesas, afetando a diversidade sociocultural e invisibilizando e/ou inferiorizando a existência dos povos e comunidades, violentando e criminalizando suas lutas e modos de vida.

Nesse contexto, é necessário tomar atitudes éticas e urgentes, dentre as quais reconhecer e instituir Territórios Livres de Mineração. Libertar os territórios e os povos da violência das mineradoras deve ser um compromisso urgente de toda a sociedade e do Estado, pois dizer NÃO à mineração significa dizer SIM às múltiplas potências e alternativas de produção e diversidade sociocultural, aos ecossistemas e a biodiversidade. Significa garantir Água, Alimento, Terra, Território e Florestas que geram benefícios para além das fronteiras territoriais das comunidades e sujeitos que produzem e preservam esses bens comuns.

Dizer NÃO significa recusar a lógica de dependência econômica que a mineração impõe aos municípios minerados, ante a finitude dos minérios e a permanência dos passivos e contaminações deixados nos territórios, para dizer SIM a outras atividades econômicas que sejam socialmente justas e ambientalmente sustentáveis, como a agricultura familiar, a agroecologia, o turismo de base comunitária e ecológica, o agroextrativismo e os modos tradicionais de trabalhar, produzir e viver dos povos e comunidades, capazes
de garantir a Soberania e Segurança Alimentar.

Nesse processo é justo reconhecer os esforços e acúmulos das comunidades violadas que carregam histórias de organização e de conhecimentos ancestrais, de práticas milenares ou inventivas de produção e organização social que não são apenas alternativos à mineração, mas sobretudo vinculadas e comprometidas com a vida.

Essas comunidades, junto com seus parceiros criaram e implementaram em suas lutas por sobrevivência de si e de seus territórios diferentes formas de enfrentar essas violências quando o Estado e a sociedade, de um modo geral, não se atentam, ou desconsideram as riquezas econômica, social, política, cultural e espiritual dos povos. As comunidades têm histórias próprias, de organização comunitária, e busca de acesso às instituições e políticas públicas, legislações nacionais e internacionais e construção de alianças com múltiplos sujeitos, estando portanto capazes de aportar para a sociedade brasileira profundos conhecimentos e práticas que rompam com os ciclos de violência da mineração e dos sujeitos que a implementam e/ou a defendem.

Portanto, reiterando os compromissos com a vida, com a solidariedade, o bem comum, o bem viver e a diversidade, reafirmamos o direito da sociedade de dizer NÃO à mineração.

Muriaé, 15 de Agosto de 2019

Assentamento Silvio Rodrigues
Articulação Antinuclear Brasileira
Associacao Brasileira dos Expostos ao Amianto
Ação Sindical Mineral
AGrUPa
Aldeia Tuxá Campos Itacuruba-Pe
Aliança em prol da APA da Pedra Branca
ARPA – Associação Regional dos Produtores/as Agroecológicos
Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale
Articulação Somos Todos Atingidos
Associação Brasileira de Agroecologia
Associação comunitaria rural povoado Itapicuru e Adjecencia
Associação dos Agricultores Familiares da Barroca do Faleiro e Adjacências
Associação dos Franciscanos de Santa Maria dos Anjos
Assiciação dos promotores da cultura e cidadania –
PROVIDA
Associação Quilombola de Queimados
Atingidos Santa Cruz
Cáritas Diocesana de Leopoldina
Ceifar
Centro de Integração na Serra da Misericóridia
Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata
Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais – CNPCT
Coletiva Popular de Mulheres da Zona Oeste
Comissão de Enfrentamento à Mineração na Serra do Brigadeiro
Comissão de Enfrentamento contra a mineração de Muriaé
Comissão Pastoral da Terra – BA
Comitê em defesa dos territórios frente a mineração
Comunidade João Barroca
Comunidade quilombola de Santa Rosa dos Pretos
Comissão Pro Índio – SP
Comissão Pastoral da Terra – MG
Diretório Municipal do PT em Ibirité
EAACONE- Equipe de Articulação e Assessoria às Comunidades Negras do
Vale do Ribeira SP/PR
FASE
Forum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento
Agroextrativista da Gleba Lago Grande-FEAGLE
Federação das organizações indígenas do Rio Negro
Forum de Mudanças Climáticas e Justiça Social
Fórum Sindical e Popular de Saúde e Segurança do Trabalhador e da
Trabalhadora de Minas Gerais
Frente Brasil Popular Médio Paraopeba
Grupo de Estudos de Agricultura Urbana (AUÊ! UFMG)
Instituto Terramar
IBASE
Iracambi
JPT Muriaé
Justiça Global
Laboratório de Estudos em Geopolítica do Capitalismo/UFV
LEGEC-UFV
Levante Popular da Juventude
MAM – Movimento pela Soberania Popular na Mineração
Mandato Betão
MOAB – Movimento dos Ameaçados por Barragens
Movimento Fora Fosfateira
Movimento Serra Sempre Viva
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
NEAP
Núcleo Tramas/UFC
Observatório dos Conflitos do Extremo Sul do Brasil
Pacab
PACS
POEMAS
Quilombo Santa Rosa dos Pretos/Justiça nos Trilhos
Rede Carioca de Agricultura Urbana
Rede IBEIDS
Rede Brasileira de Justiça Ambiental
Setorial de Direitos Humanos do PT
Sindicatos dos trabalhadores da mineração – MINEIROS
UFV CTA
UPP CAMAQUÃ

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